sexta-feira, outubro 20, 2006

A estas horas

Mas que sítio é este?
Penso enquanto fumo um cigarro numa varanda desconhecida, de uma casa desconhecida, num sítio desconhecido. Não vejo ninguém familiar, só vejo o vazio da atmosfera fria que sustém em silêncio uma rua desconhecida e deserta, numas horas em que apenas oiço o crepitar do cigarro que queima enquanto dou mais um bafo.
Sou a única pessoa acordada á face da terra.
Quando o vazio é a única emoção que nos ocupa, a solidão é a única testemunha de uma pessoa esquecida, arrumada a um canto.
Porque é que tudo acaba por ser tão impessoal?
Porque é que as pessoas perdem tão facilmente o contacto umas com as outras? Não porque tiveram divergências, não porque houve recentimentos, mas sim porque simplesmente seguiram caminhos opostos...
É chocante.
Nessa noite vi alguém resignado a uma garrafa de vinho, que outrora teve a consideração e respeito dos outros, mas que hoje já só lhe resta o néctar do esquecimento, que ainda saboreia graças á reforma que recebe depois de uma vida inteira a trabalhar. Provavelmente bebe para esquecer. É alguém que não é mais do que um objecto, uma peça de roupa que já não se usa. Em tempos fez coisas boas, coisas más, teve alegrias, desgostos, mas a estas horas da noite já ninguém se lembra.

RL